segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

O HOMEM QUE GANHAVA PERDENDO

A água começava a entrar em ebulição. Segurando o bebê nos braços, eu contemplava pensativo aquela chama azulada aquecendo o bule. O chiado da fervura me fazia pensar na mudança que os corpos sofrem ao serem limpados de suas impurezas: a água fervente matando as bactérias, o cadinho evaporando ao fogo os minérios menos nobres que o ouro, o bisturi cortando o corpo em busca de células infectadas.
Lembrei que tudo o que é limpado, sofre. Sofre a boa árvore frutífera ao ser podada, a parede suja ao ser sulcada pela lixa, o coração humano ao ser convidado a deixar sua vida cômoda para ir em busca da verdadeira satisfação, aquela que sacia, que não foge.
Mas, isso dói. Aliás, tudo o que nos escapa do controle machuca, causa insegurança e insônia; amargura, até. Porque estamos mais do que habituados a olhar somente para aquilo que se pode ver, que se pode tocar. O horizonte longínquo, com as surpresas que esconde por detrás da névoa do entardecer, já não nos desperta mais curiosidade.
Para muitos, infelizmente, a vida ficou amarga com a passar dos anos, sem uma expectativa acolhedora. Basta um reclamar da economia, por exemplo, e a seu lado já se faz um coro de muitas vozes. Concordando, claro.
Porém, alguns são diferentes. Soube de um homem que tinha tudo para ser um desses amargos, um eterno frustrado por suas constantes trombadas com a vida. Na primeira tentativa de emprego o entrevistador lhe perguntou se teria sido capaz de tirar nota melhor no teste escrito. Disse que sim. Perdeu a vaga. ?Por que não deu tudo de si agora? Por que deixou para depois??, retorquiu o empregador.
Valeu a lição, pensou ele. E aí candidatou-se a vereador em sua cidade. Perdeu. Depois, a prefeito. Perdeu. Ainda a deputado estadual. Nova queda. A federal. Hummm... A governador do estado. Nada! Tentou o senado. Novo banho. A presidente da república! Aí, ganhou. É, ganhou... Seu nome? Abraham Lincoln, um dos melhores presidentes que os Estados Unidos já teve.
Deus trabalha estranhamente nos corações. Faz crescer perdendo; arranca um braço da árvore para lhe dar um ramo melhor e com um fruto mais doce; faz-nos passar pela pobreza para conhecer a verdadeira riqueza. E uma vez livre das impurezas, o ouro vira lingote, pesado e valioso. Mas, pouco antes era apenas pó misturado a outros pós - sujeira sem valor.
Que os dias ferventes pelos quais agora passamos sirvam-nos de sinal para os alegres que nos aguardam. E que não nos falte a coragem de prosseguir quando a derrota surgir na primeira eleição. Haverá muitas outras até chegarmos a presidente.

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  © Postado por Carlos Heron.

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